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A “síndrome do pequeno poder”


Dê o poder ao homem, e descobrirá quem ele realmente é.

Maquiavel


Você já ouviu falar sobre a “síndrome do pequeno poder”?

Esse fenômeno é explicado pela psicologia, sendo definido como uma atitude de autoritarismo por parte de um indivíduo que recebe um pequeno poder e se sente no direito de usá-lo de forma absoluta e imperativa, exorbitando sua autoridade e fugindo da razoabilidade.

Fala-se nessa síndrome, por exemplo, nas relações familiares desequilibradas e abusivas.

Mas hoje vamos tratar da “síndrome do pequeno poder” na prestação de serviços, públicos e privados, como por exemplo o poder que o porteiro de um prédio tem no controle de acesso de pessoas, exercendo esse pequeno poder de forma a limitar o direito de ir e vir; o poder que tem um funcionário que organiza filas e distribui senhas; o poder que tem um cartorário de ofício judicial de responder solicitações criando burocracia descabida e desnecessária, agindo com falta de profissionalismo e cordialidade no atendimento ao público.

Daremos um exemplo: com a pandemia que assola o país, o Poder Judiciário Estadual institucionalizou a comunicação por e-mail com as serventias judiciais. Assim, em vez de ir pessoalmente ao ofício judicial para cobrar providências e verificar aspectos procedimentais, o advogado, com o fechamento dos fóruns, foi orientado pelo próprio TJSP a enviar mensagens para os e-mails institucionais dos cartórios com essas solicitações. Alguns poucos cartórios contam com profissionais acometidos da síndrome do pequeno poder. Para ilustrar, outro dia mandamos um e-mail para um determinado ofício judicial porque havíamos protocolado uma petição com pedido urgente (ação de execução de alimentos) e, passados mais de vinte dias, sequer tinham mandado o processo à conclusão. Enviamos o e-mail solicitando que agilizassem o envio de nosso requerimento para apreciação do juiz e a resposta foi “informo que este canal não se destina a movimentação processual, devendo ser efetuado o peticionamento...”. Detalhe: a reclamação foi endereçada justamente porque já tínhamos peticionado e nada de darem andamento em um caso urgente...de que adiantaria cruzar outra petição, para ficar parada novamente?

Outro exemplo: idosos na fila de uma UBS para tomar a dose de reforço da vacina contra a COVID. Um funcionário fica na entrada como responsável por distribuir as senhas e depois chamar a senha para checar o documento e encaminhar o cidadão à sala de vacina. Ele distribuía senhas só quando achava que deveria e quando queria. Idosos com pouca mobilidade em pé, esperando a boa vontade do dito cujo para receber uma senha para poderem se sentar e esperar a vez...não custava dar imediatamente a senha a quem chegasse, mas como ele ostentaria seu poder se fizesse isso? Um idoso perdeu a paciência, começou a reclamar, e o referido funcionário ainda retrucou e mandou o idoso se acalmar senão iria chamar um enfermeiro para dar um calmante para ele.

E aqueles que podem resolver o problema diretamente, mas por má vontade criam burocracia e entraves, usando ainda por cima frases recheadas de gerundismo, do tipo: “olha, você tem que estar indo na recepção, estar pegando a papelada, estar fazendo isso e depois aquilo etc..

Essas pessoas, acometidas da “síndrome do pequeno poder”, são na maioria dotadas de baixa autoestima e, somente quando estão no exercício desse “pequeno poder” é que se sentem alguém importante.

Vale sublinhar que a ‘síndrome do pequeno poder’ não significa que o indivíduo, de fato, necessariamente exerça algum poder sobre você. Ter isso em mente é o primeiro passo para se livrar deste tipo de comportamento na sua vida.

Ao sermos vítimas de alguém opressor, não devemos jamais deixar de nos posicionarmos, porém, tomando o cuidado de jamais cometer o mesmo erro do opressor, sendo assertivos, resilientes, não permissivos, mas, também, cuidando para não sermos muito confrontadores, extrapolando o razoável.

Por fim, cumpre combater a raiz desses problemas, seja comunicando o fato aos superiores, seja conversando com a pessoa e tentando fazê-la entender o equívoco de seus atos, já que a síndrome do pequeno poder, muitas vezes, vem de origens sociais, já que toda relação de poder é uma construção da sociedade, que por vezes ainda trabalha com conceitos ultrapassados de hierarquia.


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